Massagem Tântrica em BH: Entre a Cura e a Cama
A luz do celular ilumina o rosto de um homem de 40 e poucos anos no escuro do quarto. As abas do navegador exibem um emaranhado de anúncios. Fotos discretamente sensuais, promessas de “expansão da consciência”, “despertar sensorial” e a palavra-chave que o trouxe até aqui: massagem tântrica. Ele não está sozinho. Em Belo Horizonte, uma busca silenciosa por algo — conexão, terapia, prazer — transformou essa prática milenar em um dos mercados mais ambíguos e cinzentos da cidade.
Uma fronteira nebulosa onde autoconhecimento e a mais antiga das profissões se encontram, muitas vezes no mesmo endereço.
A capital mineira, sempre tão ciosa de suas tradições, parece ter abraçado a busca pelo toque. Mas que toque é esse, afinal? Depende, e muito, de para quem você pergunta. A resposta pode custar de R$ 300 a mais de R$ 1.000 a hora.

A promessa do toque sagrado
Numa sala silenciosa na Savassi, o cheiro é de incenso, não de oportunidade. A luz é baixa e uma música instrumental suave preenche o ambiente. Aqui, “terapeutas tântricos” — muitos com formação em psicologia, fisioterapia ou longos cursos na área — defendem a prática com unhas e dentes. Eles falam em “bioeletricidade”, “ressignificação do prazer” e “cura de traumas sexuais”.
“Olha, o que eu faço aqui… não tem nada a ver com o que se vende por aí”, explica uma terapeuta que pede para não ser identificada. Ela tem mais de uma década de experiência. “As pessoas chegam aqui destruídas, desconectadas. Homens que acham que performance é tudo, mulheres que nunca sentiram o próprio corpo como um lugar de prazer. O trabalho é… é um resgate. Ensinar o corpo a sentir de novo, sem o peso da culpa ou da obrigação.”
A técnica, segundo ela, envolve toques sutis por todo o corpo, com o objetivo de despertar a energia vital, a tal da kundalini. O orgasmo, se acontecer, é consequência, não o objetivo. “É terapêutico. Ponto final”, ela crava. Para esses profissionais, a vulgarização do termo é uma ofensa, um desrespeito a uma filosofia complexa.
Um resgate que, na internet, ganha contornos bem diferentes.
O mercado cinzento dos classificados
Basta uma busca rápida em qualquer site de classificados ou mesmo no Instagram. A realidade bate na porta. Ou melhor, na tela do celular. Os anúncios pululam. “Massoterapeuta universitária”, “morena de toque inesquecível”, “atendimento especial para casais”. As fotos, quase sempre, dizem mais que o texto. Os eufemismos são a regra do jogo. “Finalização” não significa o fim da sessão, e “relaxamento completo” raramente se refere apenas a aliviar a tensão nos ombros.
Aqui, o tantra vira grife. Um selo de qualidade para um serviço que, sem ele, teria outro nome.
“A prática em si não é crime. Massagem é uma atividade lícita”, explica o advogado criminalista Mário Andrade, com o pragmatismo de quem já viu de tudo. “O problema é o que acontece ao redor dela. Se a negociação, o local e o ato final configuram uma transação sexual disfarçada, aí o buraco é mais embaixo. Entramos na esfera do favorecimento à prostituição. Mas a fiscalização… é praticamente impossível. Vive-se de aparências.”
E que aparências. Muitos espaços se vendem como “spas urbanos” ou “clínicas de bem-estar”. A fachada é limpa. A conversa, cifrada. É um jogo de insinuações onde o cliente e o prestador de serviço sabem exatamente o que está em jogo, mesmo que nenhuma palavra explícita seja dita.
Conversei com “Carlos”, 52 anos, empresário. Ele é um frequentador. “Cara, vou ser honesto. A gente trabalha a semana toda, uma pressão danada. Eu não quero complicação, não quero ir pra rua. Ali é um ambiente controlado. Você paga mais caro, mas é… mais discreto. Se chamam de tântrica, de sueca ou de tailandesa, pra mim, não faz a menor diferença. O nome é só marketing.”
A declaração de Carlos, crua e direta, joga uma luz forte sobre a questão. Para uma parcela significativa do público, o “tântrico” é apenas um adjetivo que promete uma experiência mais sofisticada, talvez menos mecânica, que a prostituição convencional. Uma espécie de “sexo com alma”, vendido em sessões com hora marcada.
No fim das contas, a busca que começa no divã do autoconhecimento para alguns, termina na cama da conveniência para outros. O mercado, inteligentemente, atende a todos. O problema é que, para cada profissional sério que estuda a filosofia indiana, parecem existir dez outros que apenas pegaram carona no nome exótico para vender um serviço antigo com uma nova embalagem.
E na selva de anúncios e promessas, fica para o cliente a tarefa quase impossível de separar o sagrado do profano. Uma aposta feita no escuro, muitas vezes a um clique de distância.
O risco? É todo seu.