Massagem Tântrica: Terapia, Tabu ou a Nova Vitrine da Solidão?
A sala tem luz baixa e cheira a incenso, um clichê quase inescapável. Na maca, um homem de 40 e poucos anos, gerente de uma multinacional, respira fundo, tentando relaxar os ombros tensos de quem passa o dia em frente a planilhas. Ele não está ali por uma dor nas costas. Pelo menos, não uma dor física. Ele buscou por “massagem tântrica” no Google depois de meses se sentindo, nas palavras dele, “meio oco por dentro”.
O que ele procura? A resposta não é simples. E o mercado que floresce em torno dessa pergunta é um terreno fértil para tudo: cura genuína, charlatanismo e uma zona cinzenta que desafia qualquer rótulo fácil.

O Corpo Como Território Desconhecido
“Olha, se a pessoa chega aqui achando que vai encontrar uma prostituição gourmetizada, ela vai se frustrar. E muito”, me conta Ana, que se apresenta como terapeuta corporal há oito anos. Ela não gosta do termo “massagista”. O espaço dela é clean, mais para consultório do que para um spa erótico. “O trabalho é sobre reconectar a pessoa com o próprio corpo. Um corpo que a gente aprendeu a ignorar ou a ver só como objeto de desejo. Não é sobre o orgasmo, entende? É… é sobre estar presente, sentir a própria pele, a própria respiração. O resto é consequência.”
A promessa é grandiosa. Numa sociedade que vende sexo em cada esquina, mas pune a intimidade real, a ideia de uma terapia focada no corpo e na “bioeletricidade” soa quase revolucionária. Fala-se em “desbloqueio de couraças musculares”, em “expansão da consciência”, em curar traumas sexuais e a anedonia, a incapacidade de sentir prazer.
Um discurso potente. E lucrativo.
Sessões podem variar de R$ 400 a mais de R$ 1.000. Nas redes sociais, a divulgação é cuidadosa. As fotos são artísticas, etéreas. Os textos falam em autoconhecimento, sagrado masculino e feminino. Ninguém usa a palavra “sexo”. Mas a ambiguidade é a alma do negócio.
A Linha Tênue Que Vende (e Confunde)
Vamos ser diretos: a linha que separa a terapia tântrica da prostituição, aos olhos do público e de muitos clientes, é tênue. E, por vezes, propositalmente invisível. Para cada terapeuta com formação séria, que estudou anatomia, psicologia e as filosofias orientais que embasam a prática, há dezenas de outros que fizeram um curso de fim de semana e viram um nicho de mercado.
É aqui que o buraco fica mais embaixo.
Não existe uma regulamentação. Nenhum conselho profissional. Qualquer um pode alugar uma sala, comprar um óleo de amêndoas e se autointitular terapeuta tântrico. O risco não é só financeiro. É emocional. Pessoas chegam vulneráveis, buscando ajuda para questões profundas de solidão e inadequação. Um profissional mal preparado, ou mal-intencionado, pode fazer um estrago.
“Eu… eu vim esperando uma coisa, vou ser sincero. Li uns relatos na internet, achei que seria uma experiência sexual diferente”, admite Marcos, o gerente do início da reportagem, que pediu para não ter o sobrenome publicado. “Mas o que aconteceu ali foi outra história. A terapeuta passou a primeira meia hora só me ensinando a respirar. A tocar meu próprio braço, meu rosto. Parece ridículo falando assim, mas foi… desconcertante. Percebi que eu não sabia mais sentir meu corpo sem uma finalidade sexual.”
A experiência de Marcos parece genuína. Mas quantos como ele acabam em lugares que apenas simulam um verniz terapêutico para oferecer o que sempre foi vendido de formas mais diretas? A resposta está no silêncio de quem não quer admitir que foi enganado ou que, no fundo, era exatamente aquilo que buscava, mas com um nome mais palatável.
No fim das contas, a massagem tântrica talvez seja apenas um dos sintomas mais claros do nosso tempo. Um reflexo gritante de uma sociedade que anseia por toque, por intimidade e por conexão, mas que desaprendeu o caminho para pedi-los de forma honesta. A questão real não é se a terapia funciona ou não.
É o que a sua crescente popularidade diz sobre todos nós.